Kissinger e o Afeganistão
Pensava que nada entendia de política até ouvir a generalidade dos comentários sobre “quatro surpresas” cujas explicações são de “La Palisse”. Ilustrando que o mais difícil é ver o óbvio (E. A. Poe); a lei de Ockam: a explicação mais simples é geralmente a melhor; e que a inteligência militar é por vezes uma contradição de termos: como dinamismo burocrático ou pragmatismo universitário.
Primeiro: porque colapsou o governo?
Resposta: Porque se apercebeu que as forças armadas se desintegravam. Há uma guerra. O meu exército foge. Que faz um governo? Fica para ser fuzilado?
Mas (segundo) porque colapsaram as forças armadas? Porque os chefes militares optaram por negociar com os talibans.
E porquê? Porque sabiam que iam perder.
E porquê? As previsões mais optimistas (de “inteligência militar”) apontavam no máximo para uma capacidade de resistência de seis meses.
Ora, porque há-de um exército lutar, em vez de negociar os melhores termos de rendição possíveis (eu entrego as minhas armas, ponho a roupa de civil e vou, tentando passar despercebido, para casa proteger a minha família), quando sabe que a derrota é fatal? Tirando situações excepcionais, a opção é sempre negociar.
Como disse Patton, eu não protejo os meus morrendo, mas matando o inimigo. Se impossível, então negoceio. Se ainda impossível, então escondo-me com eles. O objectivo é sempre o mesmo: a sobrevivência.
Mas porque era a derrota fatal? Primeiro, não eram 300 mil tropas (como o presidente Biden disse), havendo muitos apenas no papel recebendo o ordenado e estando em casa. Segundo, reinava a desmoralização pela razão anterior e a falta de credibilidade de um governo corrupto que só a presença americana aguentava: a corrupção desmoraliza. Terceiro, tendo os talibans a iniciativa de concentrar e atacar onde desejassem, a hipótese de resistência dependia de reforços e abastecimento, por via aérea. Como lembrou Napoleão, um exército marcha sobre o seu estômago.
Ora a força aérea deixou de existir quando os EUA retiraram os contratos privados de manutenção.
Ou seja, o exército afegão era na realidade muito menos numeroso que no papel, estava completamente desmoralizado (com a corrupção no seu seio e de um governo sem credibilidade para ser respeitado) e não tinha capacidade logística de resistir.
Mas… porquê o falhanço em criar (durante vinte anos…) um exército que lutasse? As pessoas lutam (além da sobrevivência) por um ideal. A corrupção (nas forças armadas e governo) destruíram-no. E a presença estrangeira longa num país é inimiga da auto-estima, o conceito mais negligenciado na política internacional segundo o vencedor de vários prémios Pulitzer, o jornalista Friedman (autor de A Terra é Plana).
Donde, ao lidar com outras culturas é preciso não só não prolongar (a doutrina de Obama) como ter muito, muito, cuidado nos contactos: o primeiro governador militar americano no Iraque, recebeu de prenda dos filhos um par de botas com um cartão: “mostra-lhes como é…, pai”… Na primeira reunião quando os líderes da oposição a Saddam Hussein recém-regressados lhe perguntaram como ia ser o governo, a resposta foi na essência: posso, quero e mando. O que faz isto à auto-estima? À motivação? À moral?
Eu aldeão estou no meio de uma guerra civil. De uns não gosto, mas são dos meus. Os outros dão rebuçados aos meus filhos mas são estrangeiros… O que estão cá a fazer?
E (terceiro) porque correu mal a retirada? Por falta de tempo: os EUA pensaram que os seus aliados afegãos estavam predispostos a morrer durante seis meses… para que pudessem retirar com tranquilidade…
Sendo que relativamente à retirada há três questões distintas: 1) se se devia – uma imbecilidade segundo Tony Blair; 2) quando; e 3) como. Esta última para ser uma verdadeira retirada e não uma debandada, requer tempo (que não houve) e espaço: Cabul, os centros das principais cidades e algumas vias de comunicação fundamentais.
Tudo negociável com os talibans dado o seu interesse financeiro e desinteresse em morrer por algo que fatalmente obteriam com uns meses de paciência. Ao fim e ao cabo esperaram vinte anos. Certamente que os argumentos de cima os convenceriam a esperar mais uns meses.
Quarto (e finalmente): surpreendente as cenas junto ao aeroporto de Cabul? Os milhares de afegãos abandonados?
Bem, no Vietname, os montanheses (aliados dos americanos) foram deixados para trás e trucidados. No Iraque os curdos viram-se, de repente, sozinhos. E no Afeganistão agora foi o que se viu.
Lembrando a famosa frase de Henry Kissinger, de que se se é inimigo dos EUA deve-se estar preocupado; mas se se é amigo, então é… fatal.
P.S.: Mas podemos estar tranquilos. Porque enquanto o de cima se passava o presidente da ONU fazia apelos aos talibans… e os “líderes” da EU lamentavam… o governo dos talibans não ser inclusivo e representativo… Com o amigo leitor pagando para quem nem sequer tem ideia do ridículo.
Quanto ao mais, o mundo deve muito aos EUA. Mas precisa de uma Europa forte. O que significa sem o peso morto actual do clube mediterranée.
Resposta: Porque se apercebeu que as forças armadas se desintegravam. Há uma guerra. O meu exército foge. Que faz um governo? Fica para ser fuzilado?
Mas (segundo) porque colapsaram as forças armadas? Porque os chefes militares optaram por negociar com os talibans.
E porquê? Porque sabiam que iam perder.
E porquê? As previsões mais optimistas (de “inteligência militar”) apontavam no máximo para uma capacidade de resistência de seis meses.
Ora, porque há-de um exército lutar, em vez de negociar os melhores termos de rendição possíveis (eu entrego as minhas armas, ponho a roupa de civil e vou, tentando passar despercebido, para casa proteger a minha família), quando sabe que a derrota é fatal? Tirando situações excepcionais, a opção é sempre negociar.
Como disse Patton, eu não protejo os meus morrendo, mas matando o inimigo. Se impossível, então negoceio. Se ainda impossível, então escondo-me com eles. O objectivo é sempre o mesmo: a sobrevivência.
Mas porque era a derrota fatal? Primeiro, não eram 300 mil tropas (como o presidente Biden disse), havendo muitos apenas no papel recebendo o ordenado e estando em casa. Segundo, reinava a desmoralização pela razão anterior e a falta de credibilidade de um governo corrupto que só a presença americana aguentava: a corrupção desmoraliza. Terceiro, tendo os talibans a iniciativa de concentrar e atacar onde desejassem, a hipótese de resistência dependia de reforços e abastecimento, por via aérea. Como lembrou Napoleão, um exército marcha sobre o seu estômago.
Ora a força aérea deixou de existir quando os EUA retiraram os contratos privados de manutenção.
Ou seja, o exército afegão era na realidade muito menos numeroso que no papel, estava completamente desmoralizado (com a corrupção no seu seio e de um governo sem credibilidade para ser respeitado) e não tinha capacidade logística de resistir.
Mas… porquê o falhanço em criar (durante vinte anos…) um exército que lutasse? As pessoas lutam (além da sobrevivência) por um ideal. A corrupção (nas forças armadas e governo) destruíram-no. E a presença estrangeira longa num país é inimiga da auto-estima, o conceito mais negligenciado na política internacional segundo o vencedor de vários prémios Pulitzer, o jornalista Friedman (autor de A Terra é Plana).
Donde, ao lidar com outras culturas é preciso não só não prolongar (a doutrina de Obama) como ter muito, muito, cuidado nos contactos: o primeiro governador militar americano no Iraque, recebeu de prenda dos filhos um par de botas com um cartão: “mostra-lhes como é…, pai”… Na primeira reunião quando os líderes da oposição a Saddam Hussein recém-regressados lhe perguntaram como ia ser o governo, a resposta foi na essência: posso, quero e mando. O que faz isto à auto-estima? À motivação? À moral?
Eu aldeão estou no meio de uma guerra civil. De uns não gosto, mas são dos meus. Os outros dão rebuçados aos meus filhos mas são estrangeiros… O que estão cá a fazer?
E (terceiro) porque correu mal a retirada? Por falta de tempo: os EUA pensaram que os seus aliados afegãos estavam predispostos a morrer durante seis meses… para que pudessem retirar com tranquilidade…
Sendo que relativamente à retirada há três questões distintas: 1) se se devia – uma imbecilidade segundo Tony Blair; 2) quando; e 3) como. Esta última para ser uma verdadeira retirada e não uma debandada, requer tempo (que não houve) e espaço: Cabul, os centros das principais cidades e algumas vias de comunicação fundamentais.
Tudo negociável com os talibans dado o seu interesse financeiro e desinteresse em morrer por algo que fatalmente obteriam com uns meses de paciência. Ao fim e ao cabo esperaram vinte anos. Certamente que os argumentos de cima os convenceriam a esperar mais uns meses.
Quarto (e finalmente): surpreendente as cenas junto ao aeroporto de Cabul? Os milhares de afegãos abandonados?
Bem, no Vietname, os montanheses (aliados dos americanos) foram deixados para trás e trucidados. No Iraque os curdos viram-se, de repente, sozinhos. E no Afeganistão agora foi o que se viu.
Lembrando a famosa frase de Henry Kissinger, de que se se é inimigo dos EUA deve-se estar preocupado; mas se se é amigo, então é… fatal.
P.S.: Mas podemos estar tranquilos. Porque enquanto o de cima se passava o presidente da ONU fazia apelos aos talibans… e os “líderes” da EU lamentavam… o governo dos talibans não ser inclusivo e representativo… Com o amigo leitor pagando para quem nem sequer tem ideia do ridículo.
Quanto ao mais, o mundo deve muito aos EUA. Mas precisa de uma Europa forte. O que significa sem o peso morto actual do clube mediterranée.
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