Alterações – e perplexidades – no novo regime de distribuição de seguros
O novo regime jurídico da distribuição de seguros e de resseguros altera de forma profunda o paradigma que tem vigorado. Não obstante, os prazos transitórios, inicialmente generosos quando previstos na Diretiva de 2016, revelaram-se drasticamente curtos, quando transpostos para o ordenamento português.
Esta circunstância deve-se ao facto de a Diretiva prever que os Estados-Membros deveriam adotar as normas e regulamentos necessários à implementação da mesma até julho de 2017, para entrarem em vigor em 1 de outubro de 2018, mas o diploma que aprovou o novo regime apenas foi publicado no Diário da República no passado dia 16 de janeiro.
Assim, e na ausência de norma expressa quanto à data da respetiva entrada em vigor, a Lei 7/2019 entrou em vigor no dia 21 de janeiro de 2019. O legislador estabeleceu, porém, que, com exceção das disposições que habilitam a Autoridade de Supervisão a emitir normas regulamentares, a mesma produz efeitos retroativos a 1 de outubro de 2018.
Assim sendo, apesar de ficarem salvaguardados os requerimentos que se encontravam pendentes na referida data (em linha com o disposto na regra geral vertida no artigo 12.º do Código Civil), o calendário fixado suscitou um conjunto de perplexidades.
Com o desaparecimento da categoria de mediador de seguros ligado, a Lei determina que os candidatos a esta categoria deveriam alterar os respetivos requerimentos que se encontrassem pendentes na data da sua entrada em vigor. Sucede, porém, que a Lei determina que as referidas alterações deveriam ser solicitadas no prazo de 30 dias a partir da data de produção de efeitos da lei, isto é, a partir de 1 de outubro de 2018! Ou seja, quando no dia 21 de janeiro a lei entrou em vigor, este prazo de 30 dias já tinha expirado.
Do mesmo modo, os mediadores de seguros ligados registados à data da produção de efeitos do diploma e que foram automaticamente reclassificados noutras categorias no dia 21 de janeir, ficaram obrigados a conformar-se com as novas regras no prazo de 120 dias a contar da data de produção de efeitos do novo regime. O mesmo prazo foi também conferido para o caso de os mediadores de seguros ligados reclassificados pretenderem registar-se numa categoria distinta daquela em que foram automaticamente convertidos. Ora, considerando que o diploma produziu efeitos a 1 de outubro de 2018, estes prazos terminaram em 29 de janeiro de 2019. Ou seja, no dia em que a Lei entrou em vigor já tinham decorrido 112 dias deste prazo, restando apenas aos operadores oito dias para adotarem os procedimentos aplicáveis.
Finalmente, em sede de regime transitório, conferiu-se aos operadores um prazo até 23 de fevereiro de 2019 para se conformarem com as normas aplicáveis em matéria de qualificação adequada. Embora este prazo fique sempre prejudicado nos casos em que o cumprimento daquelas normas esteja condicionado a regulamentação prévia a emitir pela Autoridade de Supervisão, este foi o único prazo que não resultou prejudicado logo à partida pela produção retroativa de efeitos da Lei.
Atendendo ao supra exposto, e considerando que está em causa a adoção de novas políticas internas, a alteração de modelos contratuais existentes, a frequências de novos cursos de formação que terão ainda que ser reconhecidos pela Autoridade de Supervisão e a implementação de novos procedimentos internos, faria sentido que o legislador reequacionasse os prazos conferidos, permitindo a contagem dos mesmos a partir da data de entrada em vigor da lei ou, pelo menos, da data da sua publicação. É que, tal como ficaram estabelecidos, custa-nos a crer, como impõe o Código Civil, que, na fixação do sentido e alcance da lei, o legislador tenha consagrado as soluções mais acertadas.